sábado, 26 de fevereiro de 2011

O "cemitério" de aviões de Manaus - Parte 2

Na segunda parte da série de artigos sobre as aeronaves abandonadas dentro da área do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, falaremos sobre o par de Boeing 737-200 da Vasp: o PP-SMB e o PP-SPG.

Para ler a parte 1, clique aqui





III. Boeing 737-2A1/Adv PP-SMB

O final do mês de janeiro de 2005 é lembrado por muitos como o instante final de vida de uma das mais importantes empresas aéreas do país. Após sete décadas de existência, a Viação Aérea de São Paulo – VASP tinha cassada sua licença operacional pelo então DAC, marcando o final de sete décadas de uma história cheia de pioneirismos.

De acordo com a ordem cronológica adotada em nossa série de matérias sobre o cemitério de aeronaves de Manaus, o Boeing 737-2A1/Adv PP-SMB foi a quarta aeronave a ser desativada, todavia é impossível iniciar a segunda parte de nossa série sem falar um pouco de uma aeronave que detém quase a mesma importância de seu irmão mais famoso, o PP-SMA.

Década de 1960. A VASP, com algum atraso, iniciava a transição para a era do jato. Todavia naquela época o Departamento de Aviação Civil tinha um papel que extrapolava o que faz a atual ANAC: ela regulava e autorizava a aquisição de aeronaves e distribuição de rotas. Em 1965 a VASP questionara em público e na imprensa o fato de as rotas da então falida Panair do Brasil terem sido repassadas exclusivamente para a Varig e Cruzeiro e logo em seguida assistiria os interesses da Varig novamente cruzarem seu caminho.

Somente a Varig era autorizada pela DAC para adquirir aeronaves da Boeing e, da mesma forma que ocorreria anos depois quando a VP comprou seus Airbus A300, a companhia paulista não pôde inicialmente adquirir os Boeing 737 pois a RG demonstrara interesse no modelo; por esta razão a VP trouxe em 1968 um par de BAC One Eleven.

A VASP, empresa estatal, tinha grande interesse em operar aeronaves a jato da Boeing a partir de Congonhas e inicialmente considerou a aquisição de quatro Boeing 727-200. O governador do Estado de São Paulo Abreu Sodré ratificou esta intenção em março de 1968 contudo havia um grande porém: o Boeing 727-200 não era capaz de operar no seu peso máximo a partir de Congonhas para destinos no Nordeste e na região Sul. Como a Varig desistira do 737 em favor do Boeing 727-100, a VASP teve autorização de comprar cinco Boeing 737-200, aeronave que cumpria os requisitos para voar de e para CGH.


PP-SMA, ainda na fábrica da Boeing, com a pintura original do Boeing 737-200 da VASP. Acima o PP-VJH, Boeing 707 protótipo que depois voou na Varig e na FAB como 2403



A chegada dos quatro Boeing 737-200 no aeroporto de Congonhas em 18 de julho de 1969 marcou o início da operação do Boeing 737 na América Latina. As quatro aeronaves chegaram juntas, em fila, fazendo rasantes sobre CGH. Nas campanhas publicitárias a Vasp chamava seu 737 “Advanced” de Jumbinho, numa tentativa de compará-lo ao conforto do então novíssimo Boeing 747.

O PP-SMB, apesar de ter chegado junto do PP-SMA, SMC e SMD é considerado o segundo 737 da VASP por ter saído da linha de produção após o SMA. O PP-SMB é originalmente um 737-2A1/Adv, serial number 20093, número de linha 169; realizou o primeiro vôo em 14 de maio de 1969, sendo entregue para a VASP em 18 de julho do mesmo ano, junto com o PP-SMA, SMC e SMD. Como todo bom Boeing 737-200, tinha um par de confiáveis, barulhentos e raivosos motores Pratt & Whitney JT8D-17.

Uma questão interessante sobre os 737-200 da Vasp e da Varig é com relação ao uso do termo Advanced. Originalmente os 737-2A1 da Vasp não eram do tipo Advanced, só adquirindo esta condição posteriormente através do retrofit oferecido pela Boeing: maior potência de motores, menor consumo, maior alcance, refinamento aerodinâmico, melhores freios e maior peso máximo de decolagem. Quando a Varig recebeu seu primeiro 737-200 (PP-VME) em 1974 acabou criando o termo Super Advanced, para dar a idéia ao público de que seu 737-200 era mais moderno do que o da VASP. O 737-200 Super Advanced na prática nunca existiu.


PP-SMB no GIG, 1981
Foto por Luiz André Farias


PP-SMB no GIG, 1986, no mesmo esquema de cores utilizado pelo A300B2
Foto por Jay Selman


PP-SMB em GRU, já com as cores do final da década de 1980
Foto por Gianfranco Beting



Originalmente o SMB era um avião de passageiros, e foi utilizado para este fim durante 22 anos. Em setembro de 1991 o SMB foi convertido em KMIA para a versão full cargo e transportando cargas voou por outros 14 anos. Nunca foi repassado ou transferido para outra companhia que não fosse do grupo da própria VASP. Em seus últimos anos voava com os títulos da VaspEx.


PP-SMB em FLN - Julho de 2000
Foto por Bruno Orofino


PP-SMB em POA - Maio de 2004
Foto por Marcelo Magalhães



Como mencionamos na introdução deste artigo, a VASP encerrou suas operações em caráter definitivo em 27 de janeiro de 2005. Todavia o SMB ainda operou por mais alguns dias, talvez por ser destinado ao transporte de carga. Em 04/02/2005 ao meio-dia o PP-SMB pousou pela última vez após três décadas e meia de operação, cumprindo o VSP9674 procedente de Belém. No período imediamente seguinte à suspensão das operações da VP, o SMB permaneceu na área verde onde está até hoje junto a outro 737-200, o PP-SPG e de um 737-300, o PP-SFN. O SFN foi devolvido ao lessor e voltou a voar, todavia o SPG e o SMB, o segundo 737 da América Latina, estaria condenado a permanecer no chão até que o desfecho do processo de recuperação judicial da VASP fosse conhecido.


PP-SFN, PP-SMB e PP-SPG - Junho de 2005
Foto por Ulrich F. Hoppe



A falência definitiva da Vasp foi decretada em 2008, e no ano seguinte o PP-SMB foi colocado em leilão junto de outras aeronaves da companhia:

JUSTIÇA GRATUITA - EDITAL DE LEILÃO JUDICIAL DE AERONAVES, ARRECADADOS E AVALIADOS NOS AUTOS DA FALÊNCIA DE “VIAÇÃO AÉREA SÃO PAULO SOCIEDADADE ANÔNIMA -VASP” PROCESSO Nº. 583.00.2005.070715- 4/003420-000. O DR. ALEXANDRE ALVES LAZZARINI, Juíz de Direito da 01ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca da Capital, na forma da lei, faz saber, que atendendo ao que lhe foi requerido pelo Administrador da Falência de VIAÇÃO AÉREA SÃO PAULO SOCIEDADADE ANÔNIMA VASP, o Leiloeiro Oficial Sr. Sérgio Villa Nova de Freitas, matriculado na Jucesp sob nº. 316, devidamente autorizado por este R. Juízo, levará em Leilão Público Oficial, a realizar-se no próximo dia 16 de Junho de 2009, às 14h00, na Casa de Portugal, sito à Avenida da Liberdade, 602 - 3º andar, Liberdade, Capital/SP, as aeronaves arrecadadas e avaliadas, no estado em que se encontram, que assim se descrevem:

LOTE 01: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SPG, Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, Manaus/AM.


LOTE 02: Aeronave, BOEING 737-200-CARGO, Prefixo PP-SMB, Série 20093. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, Manaus/AM.

LOTE 03: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SMP, Série 20779. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães, Salvador/BA.

LOTE 04: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SNB, Série 21095. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães, Salvador/BA.


LOTE 05: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SPF, Série 21073. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional Luís Eduardo Magalhães, Salvador/BA.


LOTE 06: Aeronave, BOEING 727-200-CARGO, Prefixo PP-SFG, Série 22425. Avaliação: R$ 1.365.000,00. Localização:
Aeroporto Marechal Cunha Machado, São Luís/MA.

LOTE 07: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SPI, Série 21476. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto Internacional dos Guararapes, Recife/PE.


LOTE 08: Aeronave, BOEING 727-200-CARGO, Prefixo PP-SFC, Série 21071. Avaliação: R$ 1.365.000,00. Localização:Aeroporto Internacional dos Guararapes, Recife/PE. Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º Disponibilização: Quarta-feira, 6 de Maio de 2009 Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Editais e Leilões São Paulo, Ano II - Edição 466 612

LOTE 09: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SMH, Série 20778. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Brasília/DF.

LOTE 10: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SNA, Série 21094. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Brasília/DF.


LOTE 11: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SPH 22070, Série. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto
de Brasília/DF.

LOTE 12: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SMF, Série 20589. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP


LOTE 13: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SMG, Série 20777. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP.

LOTE 14: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SMU, Série 20967. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP.


LOTE 15: Aeronave, BOEING 737-200-PAX, Prefixo PP-SFI, Série 21478. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP.


LOTE 16: Aeronave, AIRBUS A300, Prefixo PP-SNN, Série 225. Avaliação: R$ 2.310.000,00. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP.


LOTE 17: Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMZ, Série 20971. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Guarulhos /SP.


LOTE 18: Aeronave, BOEING 737-200 CARGO, Prefixo PP-SMW, Série 20346. Avaliação: R$ 420.000,00. Localização: Aeroporto de Guarulhos /SP.


LOTE 19: Aeronave, AIRBUS A300, Prefixo PP-SNM, Série 205. Avaliação: R$ 4.830.000,00. Localização: Aeroporto de Guarulhos /SP.

LOTE 20: 08 (Oito) Aeronaves:
20.01 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMA, Série 20092. Localização: Aeroporto Internacional Tancredo Neves Belo Horizonte/MG. 20.02 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMT, Série 20160. Localização: Aeroporto Internacional do Galeão Rio de Janeiro/RJ 20.03 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMR, Série 20157. Localização: Aeroporto Internacional Viracopos Campinas/SP 20.04 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMQ, Série 20155. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP. 20.05 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMS, Série 20159. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP. 20.06 - Aeronave, BOEING 737-200 CARGO, Prefixo PP-SFQ, Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP. 20.07 - Aeronave, BOEING 737-200 PAX, Prefixo PP-SMC, Série 20094. Localização: Aeroporto de Guarulhos /SP. 20.08 - Aeronave, AIRBUS A300, Prefixo PP-SNL. Série 202. Localização: Aeroporto de Congonhas - São Paulo/SP. Avaliação do lote 20: R$ 630.000,00.

TOTAL GERAL DAS AVALIAÇÕES (05/2006): R$ 16.800.000,00. (Dezesseis milhões e oitocentos mil reais). Todas as aeronaves serão vendidas no estado em que se encontram. Os valores das avaliações serão atualizados até a data do Leilão com base na tabela do Tribunal de Justiça. Será acrescida a porcentagem de 5% (cinco por cento), sobre o valor integral da arrematação, referente à comissão do leiloeiro, conforme Decreto nº. 21.981 de 19 de outubro de 1932, que regula a profissão de Leiloeiro Oficial. Ocorrendo sustação de quaisquer cheques dados em pagamento, ou devolução por insuficiência de fundos, fica desfeita a venda e imposta multa ao Arrematante de 20% (vinte por cento), do valor da arrematação, a qual será cobrada por via executiva, como dívida líquida e certa, nos termos do art. 580, do Código de Processo Civil, corrigida monetariamente até o efetivo pagamento. E para que produza os efeitos de direito é expedido o presente edital de leilão, que será publicado e afixado como de costume na forma da lei. São Paulo, 30 de Abril de 2009.


Abril de 2005


Novembro de 2005


Julho de 2008


Julho de 2009


Junho de 2010


Cockpit do PP-SMB - Junho de 2010


Fácil saber no que resultou este leilão: o PP-SMB continua abandonado e enferrujando na umidade de Manaus. Para os menos atentos é somente uma aeronave velha de uma empresa falida, mas por mais de 30 anos o azul do SMB se misturou ao azul dos céus brasileiros.



IV. Boeing 737-2L7/Adv PP-SPG


Como já mencionamos anteriormente, o Boeing 737-200 foi a espinha dorsal da VASP a partir de 1969. A empresa foi a primeira a operar uma frota exclusiva do mesmo modelo de aeronave (o próprio 737-200) entre 1976 e 1977, e durante sua história a VP utilizou 39 modelos de aeronaves 737-200. Desnecessário dizer que nem todas eram novas de fábrica e não tinham o código de cliente Boeing (2A1) designado para a VASP. Até meados da década de 90 a empresa continuou recebendo alguns 737-200 usados e um deles foi o PP-SPG.

O PP-SPG é um avião quase uma década mais novo do que seu companheiro PP-SMB. A Oceania e o Pacífico Sul foram o seu lar inicial: realizou o primeiro vôo em 18/09/1978 e foi entregue em 29/09/1978 com a matrícula C2-RN6 ao seu cliente original, a Air Nauru, empresa que serve ao longínquo país situado na Micronésia e que hoje se chama Our Airline. O número de série do avião é 21616 e número de linha 533, SELCAL AFBL.


C2-RN6 em MEL - Novembro de 1992
Foto por Jay Selman



O C2-RN6 voou pela Air Nauru até o ano de 1994. Em 08/12/1994 a VASP recebeu a aeronave com a matrícula PP-SPG, e a VP acabou sendo a segunda e derradeira companhia pela qual o avião voou.


PP-SPG em FLN - Outubro de 1998
Foto por Bruno Orofino



Ao PP-SPG coube a questionável honra de ter sido o último avião transportando passageiros em vôo regular a pousar em Manaus operando um vôo da VASP. Às 20h do dia 24/01/2005 o SPG pousou em Manaus procedente de Belém cumprindo o VP4198, finalizando 27 anos de vida operacional. Três dias depois a Vasp encerraria definitivamente suas operações.

A aeronave ficou a princípio no pátio de estadia do TECA, sendo transportado em meados de 2005 para a área verde onde se encontra hoje. Da mesma forma que ocorreu com o SMB, o PP-SPG ficou parado aguardando a decretação da falência da VASP. Assentos, máscaras de oxigênio, bins e safety cards permanecem dentro da aeronave. Dentre os aviões que estão na primeira área de abandono do AIEG, o PP-SPG é a que é menos visível ao público, uma vez que se encontra cercado pelo PP-SMB, PP-TPC e PR-GPT.


Novembro de 2005


PP-SMB e PP-SPG - Novembro de 2007


Cockpit PP-SPG - Junho de 2010


Cabine de passageiros - Junho de 2010


PP-SPG - Junho de 2010

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O "cemitério" de aviões de Manaus - Parte 1


Atendendo a diversos pedidos enviados por email e comentários, provenientes de nossos seguidores e leitores, o MSTeam Files inicia a primeira parte de uma série de três onde contaremos um pouco da história dos aviões que fazem parte do cemitério de aeronaves abandonadas do aeroporto Eduardo Gomes. Todavia gostaríamos de deixar bem claro ao leitor o fato de que somente falaremos dos aviões que de fato estão abandonados e desativados. Não consideraremos aqui aeronaves paradas temporariamente, que ocupam posição no PÁTIO do AIEG, e nem aquelas cuja única função é fornecer peças para outras aeronaves do mesmo modelo ainda operacionais. O critério utilizado foi: aeronave abandonada em área verde do AIEG.

Existem dois grupos de aeronaves abandonadas no AIEG, um com quatro e outro com três aeronaves. Considerando os critérios acima expostos, são sete as aeronaves as quais terão parte de sua história relatada nestes artigos:

A primeira parte contará a história dos DC-8 da TCB-Transportes Charter do Brasil (PP-TPC) e da Promodal (PR-GPT)

A segunda parte falará sobre o par de 737-200 da Vasp, parados desde janeiro de 2005: PP-SMB e PP-SPG

A terceira parte relatará a história dos três cargueiros do “novo” cemitério do AIEG: dois 707-300C, um da Skymaster (PT-MTR) e um da Beta (PP-BRI), além de um outro DC-8 da Skymaster (PR-SKI).


Mapas de localização das aeronaves abandonadas:

Mapa 1: localização das duas áreas de aeronaves abandonadas


O cemitério mais “antigo”, assinalado no mapa 1 com a letra A, fica numa área verde ao lado do pátio principal, da ponte Fox e no início da taxiway Alfa. Neste local encontram-se os dois 737-200 da Vasp e os DC-8 da TCB e Promodal. O mapa 2 abaixo mostra a disposição das aeronaves no local:


Mapa 2: disposição das aeronaves do "cemitério" A

1. Promodal Douglas DC-8-71F PR-GPT
2. Transportes Charter do Brasil Douglas DC-8-52F PP-TPC
3. Vasp Boeing 737-2L7 /Adv PP-SPG
4. VaspEx Boeing 737-2A1/Adv(F) PP-SMB


Foto por Alexandre J.B. Cavalcanti via MyAviation.net




O “novo” cemitério, destacado no mapa 1 com a letra B, localiza-se em
outra área verde na lateral da pista entre o final da taxiway Bravo e início da taxiway Charlie. Aí encontram-se parados os dois aviões da Skymaster (um DC-8 e um 707) e um 707 da Beta. O mapa 3 abaixo mostra através de algarismos a localização atual do trio de aeronaves:


Mapa 3: disposição das aeronaves do "cemitério" B


5. Skymaster Boeing 707-369C PT-MTR
6. Skymaster Douglas DC-8-62H/AF PR-SKI
7. Beta Cargo Boeing 707-351C PP-BRI



Foto por Frederico Cavalcante via Jetphotos.net



I. Douglas DC-8 PR-GPT

A história do cemitério de aviões abandonados do AIEG começa com o PR-GPT, que segundo os registros disponíveis foi o primeiro dos sete aviões a ser retirado de operação, em 02/05/2004.

O PR-GPT é um Douglas DC-8-71, fabricado em 1968 a partir de encomenda da United Airlines. O avião é originalmente um dos 88 Douglas DC-8-61 fabricados, utilizado inicialmente para o transporte de passageiros e possui quatro motores Pratt & Whitney JT3D. A matrícula original da aeronave é N8080U, número de série 45970/343, SELCAL AJHL, e foi entregue para a United em 29/03/1968.


United Airlines
McDonnell Douglas DC-8-61 N8080U (1979)
Foto por Stefan Sjogren - Stockholm Arlanda Photography



O Douglas DC-8-61 possui mesmos motores, pylons e asas do DC-8-53, mas a fuselagem é alongada em duas seções: uma anterior às asas (6 metros) e outra posterior (5 metros), totalizando 57 metros de comprimento. O cliente lançador do modelo foi a United Airlines e o N8080U serviu a empresa americana durante 22 anos. Durante os primeiros quatorze anos (1968 a 1982) manteve a motorização original, mas em outubro de 1982 foi convertido para DC-8-71, com a substituição dos quatro PW JT3D por quatro turbofans CFM56-2 de 22.144 libras de empuxo, sendo um dos 110 DC-8-60 Series a ser convertido para DC-8-70 series.


United Airlines
McDonnell Douglas DC-8-71 N8080U (1985)
Foto por Bob Garrard


Em novembro de 1990 o N8080U foi repassado pela United para a AeroUSA, e em 15/10/1992 o avião foi convertido para cargueiro pela LAN Chile Cargo. Em 31/01/1993 o avião já utilizava a matrícula chilena CC-CAX e foi entregue à Fast Air, onde voou até agosto de 1998, quando foi adquirido pela companhia cargueira mexicana Mas Air. Voou com a mesma matrícula (CC-CAX) até dezembro de 1999, quando foi rematriculado para N871MY. A aeronave permaneceria na Mas Air até 2003.


FastAir
McDonnell Douglas DC-8-71(F) CC-CAX (1992)
Foto por Gerard Helmer


MasAir Cargo
McDonnell Douglas DC-8-71(F) CC-CAX (2000)
Foto por Javier Rodriguez


MasAir Cargo
McDonnell Douglas DC-8-71(F) N871MY (2001)
Foto por Ricardo Morales - flyAPM


Em 25/11/2003 o DC-8 foi recebido pela empresa brasileira Promodal Transportes Aéreos (pertencente ao Grupo GPT) com a matrícula PR-GPT, SELCAL CDEF, e em dezembro do mesmo iniciou rotas cargueiras não regulares entre os aeroportos de Guarulhos e Manaus. Todavia a vida operacional da Promodal foi curta; às 16 horas do dia 2 de maio de 2004 o PR-GPT pousou pela última vez no Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, cumprindo o vôo GPT6001 procedente do Aeroporto José Maria Cordova/Rionegro em Medellin, Colômbia, e por aqui permaneceu. Durante alguns meses o avião ficou na área de estadia até ser rebocado para o local onde se encontra até hoje, a área verde ao lado da taxiway Alfa.


Promodal
McDonnell Douglas DC-8-71(F) PR-GPT (Guarulhos, 2003)
Foto por Paulo Herren



PR-GPT, abril de 2005
Foto por Ulrich F. Hoppe


PR-GPT, novembro de 2005
Foto por Eduardo Bentes



A única ocasião após a retirada de operação do PR-GPT na qual a aeronave foi rebocada da sua posição ocorreu no início de 2006, quando a mesma foi levada para o pátio do terminal de cargas e teve os quatro motores CFM56 removidos. Permaneceram somente as naceles as quais acabaram igualmente retiradas. Desde então nunca mais houve qualquer interesse ou movimento em relação ao PR-GPT.


PR-GPT, janeiro de 2006
Foto por Alexandre J. B. Cavalcanti


PR-GPT, outubro de 2006
Foto por Frederico Cavalcante


PR-GPT, maio de 2008
Foto por Marcos Oliveira

Um dado interessante e que finaliza nosso relato sobre o PR-GPT é que em 2006 um empresário teria mostrado interesse em adquirir a carcaça do avião para transformá-lo em restaurante. É fácil perceber que isto nunca passou de um boato ou no máximo de uma idéia, uma vez que o PR-GPT entra no sétimo ano de abandono e enferrujando sob o calor e a umidade da Amazônia.


II. Douglas DC-8 PP-TPC

Qualquer criança, quando está na escola, tem o interesse de pegar um mapa mundi e saber quais são os países que ficam próximos e mais distantes do qual reside. Para qualquer estudante brasileiro é fácil saber que as nações situadas no Extremo Oriente e na Oceania são aquelas que ficam mais longe do Brasil. É exatamente em um dos países austrais situados no Pacífico Sul onde começa a história da segunda aeronave do cemitério do Eduardo Gomes, o Douglas DC-8-52 PP-TPC.

A Nova Zelândia é, para os padrões ocidentais, um dos mais longínquos países existentes. Perdido no Pacífico Sul, próximo da Austrália, a Nova Zelândia é composta majoritariamente por duas grandes ilhas cercadas pela gigantesca imensidão do oceano. O relativo isolamento e as grandes distâncias tornaram o transporte aéreo peça chave na economia e no desenvolvimento do país; neste ponto começamos a falar um pouco sobre a Air New Zealand.

As origens da Air New Zealand remontam à TEAL (Tasman Empire Airways Limited), empresa fundada em 1940 e que após a Segunda Guerra Mundial operava vôos semanais entre Auckland e Sydney com hidroaviões Short Empire. Em 1953 a TEAL foi comprada pelos governos australiano e neozelandês, cada um possuindo exatamente 50% da companhia. No ano de 1961 o governo da Nova Zelândia comprou a parte que cabia ao governo australiano e renomeou a TEAL para Air New Zealand em 1º. de abril de 1965.

Naquela época a Air New Zealand operava com o Lockheed L-188 Electra e, ainda com o nome antigo da TEAL, assinara em setembro de 1963 um contrato com a Douglas Aircfraft para a aquisição de três Douglas DC-8-52, após o De Havilland Comet 4 ter sido descartado por ser considerado pequeno para as pretensões da ANZ . A transição para a era do jato foi essencial para que a Air New Zealand se mantivesse competitiva, haja vista a concorrência da vizinha australiana Qantas.

O primeiro DC-8-52 foi o ZK-NZA (serial number 45750/217), o qual realizou seu vôo de entrega em 20/07/1965 a partir da fábrica da Douglas em Long Beach, California. Seguiram-se o ZK-NZB (serial number 45751, entregue em 12/08/1965) e o ZK-NZC (serial number 45752/233, entregue em 22/09/1965). Os DC-8-52 da ANZ eram configurados para 129 passageiros e tinham quatro motores Pratt & Whitney JT3D-3B, cada um com 18.120 libras de empuxo. Um detalhe interessante é o fato de as três aeronaves terem sido entregues com pintura híbrida com títulos tanto da TEAL como da Air New Zealand.


Air New Zealand
Douglas DC-8-52 ZK-NZC (1971)
Foto por Bob Leask


Posteriormente a Air New Zealand recebeu outros DC-8-50 Series, o que permitiu a expansão considerável dos serviços da empresa para destinos no Pacífico e no Sudeste Asiático. A aeronave tinha grande aceitação entre os passageiros e assim o DC-8 permaneceu como flagship da ANZ até 1973, quando a empresa recebeu o primeiro McDonnell Douglas DC-10 após ter considerado a aquisição do Lockheed L-1011 TriStar e de Douglas DC-8-60 Series.

A partir de 1976 o DC-8 foi perdendo espaço dentro da Air New Zealand, com alguns aviões do modelo sendo repassados a outros operadores. Em 1981 a ANZ mantinha somente dois DC-8 em sua frota: o ZK-NZC da encomenda original e o ZK-NZE, recebido em janeiro de 1968. No mesmo ano a Air New Zealand receberia seus primeiros Boeing 747-200B e desta forma, no mês de dezembro os derradeiros DC-8 foram desativados e voaram até o Pinal Airpark em Marana, Arizona, onde permanceriam estocados em meio à aridez do deserto americano.


Air New Zealand
Douglas DC-8-52 ZK-NZC (1977)
Foto por George Canciani



ZK-NZC em Marana, 1982
Foto por AirNikon


Em julho de 1982 o ZK-NZC foi comprado pela Howard Golden e em 1987 rematriculado para N42920; neste período o avião saiu de Marana para Palm Springs, California e em 1988 a pintura da Air New Zealand foi removida. Neste ano o N42920 estava em Opa Locka, Florida, em vias de ser exportado para o Canadá e voltar a voar.


ZK-NZC/N42920
Opa Locka, Florida - Novembro de 1987


ZK-NZC/N42920
Opa Locka, Florida - Julho de 1988
Foto por Frank Schaefer


No mês março de 1989 o DC-8 recebeu a matrícula canadense C-FCRN e as cores da Crownair, empresa que operava vôos charter entre o Canadá e a Europa. Em 1991 a aeronave foi repassada para companhia peruana Faucett, onde voou como OB-1421. Em dezembro de 1994 a aeronave foi detida e confiscada pelo US Drug Enforcement Agency por estar provavelmente transportando entorpecentes.

CrownAir
Douglas DC-8-52 C-FCRN (1989)
Foto por Alistair Bridges


Faucett
Douglas DC-8-52 OB-1421 (Opa Locka, 1991)
Foto por Yakfreak - VAP


Chegamos a meados da década de 90 e neste período o DC-8 foi convertido para cargueiro e em 1998 foi entregue à TCB – Transportes Charter do Brasil. A TCB era um empresa que havia surgido em 1997 e realizava transporte não regular de carga na rota Guarulhos-Manaus-Guarulhos, prestando serviço para a VASP. A empresa já operava um DC-8-54F (PP-TNZ) e o antigo DC-8 da Air New Zealand foi a segunda aeronave da frota, operando com a matrícula PP-TPC e batizado como “Daniel”. Durante seis anos o PP-TPC voou regularmente na rota GRU-MAO-GRU, até que chegamos ao ano de 2004.

TCB - Transportes Charter do Brasil
Douglas DC-8-52(F) PP-TPC (Recife, 1998)
Foto por Normando Carvalho Jr.


PP-TPC - Guarulhos, julho de 2003
Foto por Sam Chui


2004 marcara os 39 anos de operação do PP-TPC. A TCB havia passado por dificuldades no início da década de 2000, com o PP-TNZ abandonado e canibalizado em Guarulhos. O PP-TPC mantinha-se voando contra todas as dificuldades até que na manhã de 22 de julho de 2004 o TPC realizou seu derradeiro pouso em Manaus, procedente de Guarulhos. O DC-8 operava o vôo TCJ9113 e desde então jamais voltou a voar novamente.

A aeronave permaneceu inicialmente no pátio de estadia próximo ao terminal de cargas e em meados de 2005 foi removido para a área verde onde permanece até hoje, ao lado do DC-8-71 PR-GPT. Ao contrário deste último, ninguém jamais demonstrou qualquer interesse na carcaça do avião. Ou melhor, quase ninguém.

PP-TPC, abril de 2005
Foto por Ulrich F. Hoppe


PP-TPC, outubro de 2006
Foto por Frederico Cavalcante


PP-TPC, maio de 2008
Foto por Marcos Oliveira


PP-TPC, junho de 2010
Foto por Fábio Duarte


Desde 2006 tenho recebido com relativa freqüência mensagens e e-mails procedentes de entusiastas de aviação da Nova Zelândia e ex-tripulantes da Air New Zealand a respeito da atual situação do PP-TPC. Existia até então entre a comunidade entusiasta daquele país um interesse em resgatar o que restou da aeronave para que ela pudesse ser restaurada com as cores e matrícula originais da ANZ. Todavia o estado atual da aeronave, associado aos elevados custos de sete anos ocupando espaço no AIEG e toda a logística eventualmente envolvida neste processo tornaram este sonho economicamente inviável.

Enquanto os neozelandeses amantes da aviação gostariam muito de restaurar parte de sua história aeronáutica, nós, brasileiros, encaramos o desprazer de ver logo ao lado exatamente o oposto, quando se observa o par de Boeing 737-200 da Vasp abandonados em situação semelhante. Infelizmente só nos resta a definitiva constatação que o PP-TPC hoje é somente mais um avião enferrujado e abandonado que aguarda o seu destino final: virar sucata.