sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O "cemitério" de aviões de Manaus - Parte 1


Atendendo a diversos pedidos enviados por email e comentários, provenientes de nossos seguidores e leitores, o MSTeam Files inicia a primeira parte de uma série de três onde contaremos um pouco da história dos aviões que fazem parte do cemitério de aeronaves abandonadas do aeroporto Eduardo Gomes. Todavia gostaríamos de deixar bem claro ao leitor o fato de que somente falaremos dos aviões que de fato estão abandonados e desativados. Não consideraremos aqui aeronaves paradas temporariamente, que ocupam posição no PÁTIO do AIEG, e nem aquelas cuja única função é fornecer peças para outras aeronaves do mesmo modelo ainda operacionais. O critério utilizado foi: aeronave abandonada em área verde do AIEG.

Existem dois grupos de aeronaves abandonadas no AIEG, um com quatro e outro com três aeronaves. Considerando os critérios acima expostos, são sete as aeronaves as quais terão parte de sua história relatada nestes artigos:

A primeira parte contará a história dos DC-8 da TCB-Transportes Charter do Brasil (PP-TPC) e da Promodal (PR-GPT)

A segunda parte falará sobre o par de 737-200 da Vasp, parados desde janeiro de 2005: PP-SMB e PP-SPG

A terceira parte relatará a história dos três cargueiros do “novo” cemitério do AIEG: dois 707-300C, um da Skymaster (PT-MTR) e um da Beta (PP-BRI), além de um outro DC-8 da Skymaster (PR-SKI).


Mapas de localização das aeronaves abandonadas:

Mapa 1: localização das duas áreas de aeronaves abandonadas


O cemitério mais “antigo”, assinalado no mapa 1 com a letra A, fica numa área verde ao lado do pátio principal, da ponte Fox e no início da taxiway Alfa. Neste local encontram-se os dois 737-200 da Vasp e os DC-8 da TCB e Promodal. O mapa 2 abaixo mostra a disposição das aeronaves no local:


Mapa 2: disposição das aeronaves do "cemitério" A

1. Promodal Douglas DC-8-71F PR-GPT
2. Transportes Charter do Brasil Douglas DC-8-52F PP-TPC
3. Vasp Boeing 737-2L7 /Adv PP-SPG
4. VaspEx Boeing 737-2A1/Adv(F) PP-SMB


Foto por Alexandre J.B. Cavalcanti via MyAviation.net




O “novo” cemitério, destacado no mapa 1 com a letra B, localiza-se em
outra área verde na lateral da pista entre o final da taxiway Bravo e início da taxiway Charlie. Aí encontram-se parados os dois aviões da Skymaster (um DC-8 e um 707) e um 707 da Beta. O mapa 3 abaixo mostra através de algarismos a localização atual do trio de aeronaves:


Mapa 3: disposição das aeronaves do "cemitério" B


5. Skymaster Boeing 707-369C PT-MTR
6. Skymaster Douglas DC-8-62H/AF PR-SKI
7. Beta Cargo Boeing 707-351C PP-BRI



Foto por Frederico Cavalcante via Jetphotos.net



I. Douglas DC-8 PR-GPT

A história do cemitério de aviões abandonados do AIEG começa com o PR-GPT, que segundo os registros disponíveis foi o primeiro dos sete aviões a ser retirado de operação, em 02/05/2004.

O PR-GPT é um Douglas DC-8-71, fabricado em 1968 a partir de encomenda da United Airlines. O avião é originalmente um dos 88 Douglas DC-8-61 fabricados, utilizado inicialmente para o transporte de passageiros e possui quatro motores Pratt & Whitney JT3D. A matrícula original da aeronave é N8080U, número de série 45970/343, SELCAL AJHL, e foi entregue para a United em 29/03/1968.


United Airlines
McDonnell Douglas DC-8-61 N8080U (1979)
Foto por Stefan Sjogren - Stockholm Arlanda Photography



O Douglas DC-8-61 possui mesmos motores, pylons e asas do DC-8-53, mas a fuselagem é alongada em duas seções: uma anterior às asas (6 metros) e outra posterior (5 metros), totalizando 57 metros de comprimento. O cliente lançador do modelo foi a United Airlines e o N8080U serviu a empresa americana durante 22 anos. Durante os primeiros quatorze anos (1968 a 1982) manteve a motorização original, mas em outubro de 1982 foi convertido para DC-8-71, com a substituição dos quatro PW JT3D por quatro turbofans CFM56-2 de 22.144 libras de empuxo, sendo um dos 110 DC-8-60 Series a ser convertido para DC-8-70 series.


United Airlines
McDonnell Douglas DC-8-71 N8080U (1985)
Foto por Bob Garrard


Em novembro de 1990 o N8080U foi repassado pela United para a AeroUSA, e em 15/10/1992 o avião foi convertido para cargueiro pela LAN Chile Cargo. Em 31/01/1993 o avião já utilizava a matrícula chilena CC-CAX e foi entregue à Fast Air, onde voou até agosto de 1998, quando foi adquirido pela companhia cargueira mexicana Mas Air. Voou com a mesma matrícula (CC-CAX) até dezembro de 1999, quando foi rematriculado para N871MY. A aeronave permaneceria na Mas Air até 2003.


FastAir
McDonnell Douglas DC-8-71(F) CC-CAX (1992)
Foto por Gerard Helmer


MasAir Cargo
McDonnell Douglas DC-8-71(F) CC-CAX (2000)
Foto por Javier Rodriguez


MasAir Cargo
McDonnell Douglas DC-8-71(F) N871MY (2001)
Foto por Ricardo Morales - flyAPM


Em 25/11/2003 o DC-8 foi recebido pela empresa brasileira Promodal Transportes Aéreos (pertencente ao Grupo GPT) com a matrícula PR-GPT, SELCAL CDEF, e em dezembro do mesmo iniciou rotas cargueiras não regulares entre os aeroportos de Guarulhos e Manaus. Todavia a vida operacional da Promodal foi curta; às 16 horas do dia 2 de maio de 2004 o PR-GPT pousou pela última vez no Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, cumprindo o vôo GPT6001 procedente do Aeroporto José Maria Cordova/Rionegro em Medellin, Colômbia, e por aqui permaneceu. Durante alguns meses o avião ficou na área de estadia até ser rebocado para o local onde se encontra até hoje, a área verde ao lado da taxiway Alfa.


Promodal
McDonnell Douglas DC-8-71(F) PR-GPT (Guarulhos, 2003)
Foto por Paulo Herren



PR-GPT, abril de 2005
Foto por Ulrich F. Hoppe


PR-GPT, novembro de 2005
Foto por Eduardo Bentes



A única ocasião após a retirada de operação do PR-GPT na qual a aeronave foi rebocada da sua posição ocorreu no início de 2006, quando a mesma foi levada para o pátio do terminal de cargas e teve os quatro motores CFM56 removidos. Permaneceram somente as naceles as quais acabaram igualmente retiradas. Desde então nunca mais houve qualquer interesse ou movimento em relação ao PR-GPT.


PR-GPT, janeiro de 2006
Foto por Alexandre J. B. Cavalcanti


PR-GPT, outubro de 2006
Foto por Frederico Cavalcante


PR-GPT, maio de 2008
Foto por Marcos Oliveira

Um dado interessante e que finaliza nosso relato sobre o PR-GPT é que em 2006 um empresário teria mostrado interesse em adquirir a carcaça do avião para transformá-lo em restaurante. É fácil perceber que isto nunca passou de um boato ou no máximo de uma idéia, uma vez que o PR-GPT entra no sétimo ano de abandono e enferrujando sob o calor e a umidade da Amazônia.


II. Douglas DC-8 PP-TPC

Qualquer criança, quando está na escola, tem o interesse de pegar um mapa mundi e saber quais são os países que ficam próximos e mais distantes do qual reside. Para qualquer estudante brasileiro é fácil saber que as nações situadas no Extremo Oriente e na Oceania são aquelas que ficam mais longe do Brasil. É exatamente em um dos países austrais situados no Pacífico Sul onde começa a história da segunda aeronave do cemitério do Eduardo Gomes, o Douglas DC-8-52 PP-TPC.

A Nova Zelândia é, para os padrões ocidentais, um dos mais longínquos países existentes. Perdido no Pacífico Sul, próximo da Austrália, a Nova Zelândia é composta majoritariamente por duas grandes ilhas cercadas pela gigantesca imensidão do oceano. O relativo isolamento e as grandes distâncias tornaram o transporte aéreo peça chave na economia e no desenvolvimento do país; neste ponto começamos a falar um pouco sobre a Air New Zealand.

As origens da Air New Zealand remontam à TEAL (Tasman Empire Airways Limited), empresa fundada em 1940 e que após a Segunda Guerra Mundial operava vôos semanais entre Auckland e Sydney com hidroaviões Short Empire. Em 1953 a TEAL foi comprada pelos governos australiano e neozelandês, cada um possuindo exatamente 50% da companhia. No ano de 1961 o governo da Nova Zelândia comprou a parte que cabia ao governo australiano e renomeou a TEAL para Air New Zealand em 1º. de abril de 1965.

Naquela época a Air New Zealand operava com o Lockheed L-188 Electra e, ainda com o nome antigo da TEAL, assinara em setembro de 1963 um contrato com a Douglas Aircfraft para a aquisição de três Douglas DC-8-52, após o De Havilland Comet 4 ter sido descartado por ser considerado pequeno para as pretensões da ANZ . A transição para a era do jato foi essencial para que a Air New Zealand se mantivesse competitiva, haja vista a concorrência da vizinha australiana Qantas.

O primeiro DC-8-52 foi o ZK-NZA (serial number 45750/217), o qual realizou seu vôo de entrega em 20/07/1965 a partir da fábrica da Douglas em Long Beach, California. Seguiram-se o ZK-NZB (serial number 45751, entregue em 12/08/1965) e o ZK-NZC (serial number 45752/233, entregue em 22/09/1965). Os DC-8-52 da ANZ eram configurados para 129 passageiros e tinham quatro motores Pratt & Whitney JT3D-3B, cada um com 18.120 libras de empuxo. Um detalhe interessante é o fato de as três aeronaves terem sido entregues com pintura híbrida com títulos tanto da TEAL como da Air New Zealand.


Air New Zealand
Douglas DC-8-52 ZK-NZC (1971)
Foto por Bob Leask


Posteriormente a Air New Zealand recebeu outros DC-8-50 Series, o que permitiu a expansão considerável dos serviços da empresa para destinos no Pacífico e no Sudeste Asiático. A aeronave tinha grande aceitação entre os passageiros e assim o DC-8 permaneceu como flagship da ANZ até 1973, quando a empresa recebeu o primeiro McDonnell Douglas DC-10 após ter considerado a aquisição do Lockheed L-1011 TriStar e de Douglas DC-8-60 Series.

A partir de 1976 o DC-8 foi perdendo espaço dentro da Air New Zealand, com alguns aviões do modelo sendo repassados a outros operadores. Em 1981 a ANZ mantinha somente dois DC-8 em sua frota: o ZK-NZC da encomenda original e o ZK-NZE, recebido em janeiro de 1968. No mesmo ano a Air New Zealand receberia seus primeiros Boeing 747-200B e desta forma, no mês de dezembro os derradeiros DC-8 foram desativados e voaram até o Pinal Airpark em Marana, Arizona, onde permanceriam estocados em meio à aridez do deserto americano.


Air New Zealand
Douglas DC-8-52 ZK-NZC (1977)
Foto por George Canciani



ZK-NZC em Marana, 1982
Foto por AirNikon


Em julho de 1982 o ZK-NZC foi comprado pela Howard Golden e em 1987 rematriculado para N42920; neste período o avião saiu de Marana para Palm Springs, California e em 1988 a pintura da Air New Zealand foi removida. Neste ano o N42920 estava em Opa Locka, Florida, em vias de ser exportado para o Canadá e voltar a voar.


ZK-NZC/N42920
Opa Locka, Florida - Novembro de 1987


ZK-NZC/N42920
Opa Locka, Florida - Julho de 1988
Foto por Frank Schaefer


No mês março de 1989 o DC-8 recebeu a matrícula canadense C-FCRN e as cores da Crownair, empresa que operava vôos charter entre o Canadá e a Europa. Em 1991 a aeronave foi repassada para companhia peruana Faucett, onde voou como OB-1421. Em dezembro de 1994 a aeronave foi detida e confiscada pelo US Drug Enforcement Agency por estar provavelmente transportando entorpecentes.

CrownAir
Douglas DC-8-52 C-FCRN (1989)
Foto por Alistair Bridges


Faucett
Douglas DC-8-52 OB-1421 (Opa Locka, 1991)
Foto por Yakfreak - VAP


Chegamos a meados da década de 90 e neste período o DC-8 foi convertido para cargueiro e em 1998 foi entregue à TCB – Transportes Charter do Brasil. A TCB era um empresa que havia surgido em 1997 e realizava transporte não regular de carga na rota Guarulhos-Manaus-Guarulhos, prestando serviço para a VASP. A empresa já operava um DC-8-54F (PP-TNZ) e o antigo DC-8 da Air New Zealand foi a segunda aeronave da frota, operando com a matrícula PP-TPC e batizado como “Daniel”. Durante seis anos o PP-TPC voou regularmente na rota GRU-MAO-GRU, até que chegamos ao ano de 2004.

TCB - Transportes Charter do Brasil
Douglas DC-8-52(F) PP-TPC (Recife, 1998)
Foto por Normando Carvalho Jr.


PP-TPC - Guarulhos, julho de 2003
Foto por Sam Chui


2004 marcara os 39 anos de operação do PP-TPC. A TCB havia passado por dificuldades no início da década de 2000, com o PP-TNZ abandonado e canibalizado em Guarulhos. O PP-TPC mantinha-se voando contra todas as dificuldades até que na manhã de 22 de julho de 2004 o TPC realizou seu derradeiro pouso em Manaus, procedente de Guarulhos. O DC-8 operava o vôo TCJ9113 e desde então jamais voltou a voar novamente.

A aeronave permaneceu inicialmente no pátio de estadia próximo ao terminal de cargas e em meados de 2005 foi removido para a área verde onde permanece até hoje, ao lado do DC-8-71 PR-GPT. Ao contrário deste último, ninguém jamais demonstrou qualquer interesse na carcaça do avião. Ou melhor, quase ninguém.

PP-TPC, abril de 2005
Foto por Ulrich F. Hoppe


PP-TPC, outubro de 2006
Foto por Frederico Cavalcante


PP-TPC, maio de 2008
Foto por Marcos Oliveira


PP-TPC, junho de 2010
Foto por Fábio Duarte


Desde 2006 tenho recebido com relativa freqüência mensagens e e-mails procedentes de entusiastas de aviação da Nova Zelândia e ex-tripulantes da Air New Zealand a respeito da atual situação do PP-TPC. Existia até então entre a comunidade entusiasta daquele país um interesse em resgatar o que restou da aeronave para que ela pudesse ser restaurada com as cores e matrícula originais da ANZ. Todavia o estado atual da aeronave, associado aos elevados custos de sete anos ocupando espaço no AIEG e toda a logística eventualmente envolvida neste processo tornaram este sonho economicamente inviável.

Enquanto os neozelandeses amantes da aviação gostariam muito de restaurar parte de sua história aeronáutica, nós, brasileiros, encaramos o desprazer de ver logo ao lado exatamente o oposto, quando se observa o par de Boeing 737-200 da Vasp abandonados em situação semelhante. Infelizmente só nos resta a definitiva constatação que o PP-TPC hoje é somente mais um avião enferrujado e abandonado que aguarda o seu destino final: virar sucata.

11 comentários:

  1. Maravilhosa a matéria, apesar da triste situação dessas aeronaves. O desejo era que esses aviões fossem restaurados e preservados em museu. Seria um sonho. Parabéns ao amigo Fred.

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  2. Parabens!!
    Espero mais sobre outros avioes.
    Abr Ulrich Hoppe

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  3. Ótima Matéria, agora podemos olhar para aquelas aeronaves, pelo menos o que restou delas e ver o quanto de história elas possuem.

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  4. excelente matéria, principalmente para quem não sabia da história dessas aeronaves, como eu!

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  5. Completíssima essa matéria.Nãofaltou nada.
    Parabéns!!!GILBERTO KAVALO'S-POA/RS

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  6. Fantástica reportagem, meus parabéns aos profissionais envolvidos. E pra alavancar ainda mais este universo dos abandonados gostaria de ver uma matéria como esta, direcionada aos pequenos aviões monomotores, turboélice, e demais da categoria que estão aos montes espalhados por aeroportos, aeroclubes e marinas de Manaus, deteriorando sob pleno sol e a acidez das chuvas torrenciais. E apesar de todos os contratempos poderiam ser restaurados e integrados a parques temáticos, ou um breve museu, ou serem vendidos para terceiros, ou em casos mais drásticos serem removidos a um só lugar que pudessem ser visitados por civis a fim de conhecer um pouco mais sobre o assunto.
    Grato.

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  7. ótima essa reportagem, gostaria de saber quanto seria pra resgatar uma aeronave dessas pra uso comercial.

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  8. encantador como um aviões como esses podem acumular milhares de histórias. E é consternador passar pelo aeroporto de Manaus e vê-los no estado que estão. O Brasil precisa de um cemitério de aviões de verdade.

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  9. boa tarde tem como visita esses avioes em manaus entra dentro tira fotos filma , quero ter uma lembrança como pedir autorização .....
    meu e mail italojacob.sinetram@hotmail.com

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